segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Trajetória política do movimento negro brasileiro desde o início do século XX
 Edir Marli Foeger
O surgimento das formas de organização e mobilização dos movimentos do século XX promoveu a atuação antirracistas, fazendo com que os negros enfrentassem publicamente o preconceito que os impediam viver seus direitos sociais e civis, principalmente contra o racismo existente das ideias do passado que se constituiu com o fim da escravidão, onde negros/as foram excluídos/as do mercado de trabalho e de outros espaços públicos. Este fato motivou os/as afro-brasileiros/as a construírem espaços próprios de sociabilidade, na qual pudessem frequentar sem que sofressem preconceito racial.
O Movimento Negro constitui-se pela luta dos afrodescendentes para resolver situações de preconceitos e discriminações raciais que os marginalizam no meio social, no mercado de trabalho, no sistema educacional e nos meios político e cultural.
Os jornais negros foram um estímulo nesse processo para os/as afro-brasileiros assumindo de forma crítica os preconceitos praticados na sociedade.
Em São Paulo o associativismo desencadeou a Frente Negra Brasileira (1931- 1937) contra a política antirracista, este se estendeu para outras regiões. Lideres e intelectuais desses movimentos eram chamados de elites negras. Essas organizações tinham como objetivo
garantir  a proteção  social  àqueles /as  que estavam visivelmente desamparados /as,  uma   vez  que  o Estado ainda não dispunha de  sistema amplo,  universal  e  capaz  de atender  a  todos /as   cidadãos/ãs (MOD. 03_UNID. 04, texto 01, p.175).
As mulheres negras nesse processo se destacavam pela sua formação educacional. O sociólogo Florestan Fernandes afirmou que “o movimento negro brasileiro modernizava os valores da sociedade, pois visava a transformações de caráter eminentemente democrático.” Vale lembrar que tais experiências políticas dos movimentos negros ocorreram em períodos democráticos. Pois o movimento acabou sendo desarticulada durante a vigência do Estado Novo, com regime político da Ditadura Militar.
Os regimes políticos significativos contra o racismo do período foram: a União dos Homens de Cor (UHC) e do Teatro Experimental do Negro (TEN). Ambas tinham o objetivo de dar visibilidade para a temática do preconceito racial, na valorização da identidade negra, no reconhecimento do ser negro/a brasileiro/a, visando sua inserção na comunidade política e econômica do país.
A nova mobilização antirracista veio a ter visibilidade pública com o novo contexto de democratização do país. Nas duas primeiras fases, a maior parte do movimento negro manteve-se afastado das formas tradicionais de organização das classes sociais.
Os/as intelectuais e ativistas dos movimentos negros/as inspiravam-se nas teorias marxista e dos movimentos negros norte-americanos e dos negros/as africanos/as, porém não se copiava as ações, adequava se a realidade do Brasil.
Na terceira fase, entretanto, boa parte do movimento negro se aproxima dos partidos e dos sindicatos, procurando estabelecer um liame nas ações de natureza classista e anti-racista.
O sociólogo Hasenbalg evidencia a existência de mecanismos discriminatórios, que prejudicam a mobilidade dos grupos de cor/raça do Brasil. O estudo trouxe a sustentação da luta antirracista no país, sendo que o movimento negro encontrava e encontra nelas bases argumentativas para seus discursos e ações, num contexto discriminatório entre indivíduos e grupos.
A atitude e a determinação das mulheres negras nos movimentos provocaram o rompimento da dominação masculina, pois até então havia a presença significativa das mulheres no movimento negro, mas muitas vezes limitava-se aos bastidores, “elas encontravam grandes empecilhos para ocupar as posições de dirigentes nas organizações políticas negras.”
As mulheres negras intelectuais se destacaram pelas reflexões das consequências do racismo sobre os negros dentre elas Beatriz Nascimento (1942-1995) e Lélia Gonzalez (1945-1994).
A historiadora Beatriz do Nascimento destaca o negro como participante da construção histórico-social e aponta os problemas gerados pela escravidão enfrentados pelo/a negro/a ao reconstituir sua identidade. Para ela as mulheres negras sofriam tanto pelo racismo devido pertencer a um grupo discriminado, como também pelo patriarcalismo, tais questões perpetuam sua subordinação na hierarquia social constituída ao longo do tempo.
Lélia Gonzalez buscava refletir e atuar em organizações coletivas com temáticas raciais.
Para Gonzalez tanto negros como brancos pobres sofrem pelo capitalismo.  Porém o negro sofre discriminações e preconceito racial gerando a hierarquização na estrutura social. Também destaca que é preciso mudar o pensamento social difundido em todas as classes, retirando os sujeitos femininos negros das posições inferiores. Constata-se que entre as classes sociais exista a exploração econômica, opressão política e dominação cultural que resulta na desigualdade econômica, no privilégio político e da discriminação cultural, respectivamente.
O primeiro movimento organizado de mulheres estava ligado ao movimento negro e feminista contra a ditadura. Com o objetivo de adquirir visibilidade, agenda própria e lutar contra a discriminação racista.
Um dos conflitos mais marcantes para a organização das mulheres negras como entidades autônomas ocorreu na ocasião da formação do Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo que, em 1984, se constituiu sem ter nenhuma mulher negra como integrante. Essa ausência de representação negra em espaços destinados à participação, fez com que se sentisse a necessidade de maior articulação política para sustentar as lutas das mulheres negras. 
Este processo proporcionou conquistas para as mulheres tanto no Conselho Estadual, quanto no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, criado anos mais tarde, em 1988.
As conquistas feministas beneficiavam as mulheres indiscriminadamente, por outro, o movimento de mulheres negras via a necessidade de manter seu questionamento sobre a pertinência de focalizar políticas para suas demandas específicas, a questão do racismo que se caracteriza em sua dominação e exploração potencializando os efeitos negativos para as mulheres negras.
O enfrentamento da militância negra junto ao Conselho da Condição Feminina foi fator decisivo para o fortalecimento e maior articulação das mulheres negras, surgindo outras redes de articulação de ativismo político, como o “I encontro Estadual de Mulheres Negras”, em São Paulo, no ano de 1984 e após quatro anos o “I Encontro Nacional de Mulheres Negras”, ampliando e fortalecendo a construção de coletivos em outras regiões do Brasil. Os debates referentes ao temas e demandas do movimento de mulheres negras foram ampliando-se à medida que o ativismo ganhava mais fôlego e experiência na ação coletiva.
A importância do movimento de mulheres negras trouxe impactos na sociedade suas experiências e ações habilitaram esse ativismo a desenvolver intervenções propositivas em diferentes instâncias.
Uma das principais reivindicações dos movimentos era o direito da cidadania. O movimento negro não reivindicava apenas a dimensão material e sim o patrimônio cultural. Busca-se o reconhecimento das diferenças a sua identidade social para que ela se sinta em condições de lutar pela sua dignidade na emancipação individual e coletiva.
O movimento negro contemporâneo cresceu, diversificou suas formas de ação transformando-se e obtendo várias conquistas. 
A constituição de 1988 foi o ponto crucial para o ativismo negro em suas ações de implementação de políticas públicas.
O I Encontro Nacional de Entidades Negras ocorreu na cidade de São Paulo, em 1991, devido à necessidade do fortalecimento negro, esse encontro trouxe a ascensão do movimento negro perante a sociedade e o estado.
Assim a busca do movimento negro é a universalização dos direitos, de acordo com os estudos do módulo 03 é a construção de uma imagem negra sem os estereótipos característicos do senso comum nacional, a valorização de práticas e saberes de comunidades negras tradicionais, o direito a terra aos descendentes de escravizados/as, além de educação diferenciada, voltada para o enfrentamento do racismo contra esses grupos.
Na década de 1990 fundou o órgão Fundação Palmares que tinha o objetivo atender demandas do movimento negro ligado a cultura. Em 1995, ocorreu a Marcha de 1995 que tinha como proposta ao Estado o enfrentamento das desigualdades raciais, para tanto deveria ter a destinação de verbas específicas para lidar com essa demanda. O resultado da Marcha foi o decreto presidencial que criava um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) com objetivo de promover políticas para “a valorização da população negra”. Em 1996, foi proposto Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH I), onde o governo assume o compromisso de realizar estratégias de combate às desigualdades raciais por meio de políticas direcionadas para a população negra.
Após a conferência de Durban e na gestão do Presidente Luís Inácio Lula da Silva destacadas duas ações importantes para todo o território nacional.
A primeira é a promulgação da Lei 10639/2003, que institui o Ensino de História e Cultura da África e dos/as Afro-brasileiros/as em todos os estabelecimentos de ensino do país.
A segunda ação foi a criação da Secretaria Especial Para Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), em 2003, com a proposta de envolver os ministérios e os demais órgãos do poder executivo para garantir a transversalidade das políticas de combate ao racismo.
Reconhece-se que a igualdade é importante para o desenvolvimento da sociedade. Nas últimas décadas várias mudanças significativas ocorreram na sociedade, negros adquiriram maiores níveis da educação e de participação no mercado de trabalho.
Constata-se que os movimentos surgiram em torno do racismo existente na sociedade, se constituindo de diferentes formas ao longo da história, dessa maneira tem contribuído de maneira visível para as conquistas dos direitos dos negros, porém faltam muitos esforços de diferentes setores da sociedade para a democracia de todos os espaços.


Referência:
Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça | GPP – GeR: módulo I / Orgs. Maria Luiza Heilborn, Leila Araújo, Andreia Barreto. – Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 20

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