quinta-feira, 31 de maio de 2012

Análise da Elaboração de projetos e as legislações das Políticas Públicas de Gênero e Raça

*Henriqueta R. C. Froz


O tema abordado na unidade 4 foca discussões acerca dos conceitos que contribuíram para a técnica de elaboração de projetos vinculados à promoção da igualdade de gênero e racial. Desta feita, a unidade em apreço teve como propósito abordar uma discussão sobre o processo de construção e a transversalidade de gênero e raça na gestão pública.

De modo específico, a unidade analisa os documentos relativos aos direitos de mulheres e a negros/as, bem como um roteiro para elaboração de projetos com recursos governamentais, além do Modelo de Plano de Ação do II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Nesse ínterim, merece destaque a análise dos principais conceitos apresentados, quer seja:  


Análise da Formalização de Convênios e da Prestação de Contas, Termo de Cooperação e Termos de Parcerias – Quando abordamos a formalização de convênio, faz-se necessário observar a legislação que a regula. A Portaria Interministerial nº 127, de 29/05/0808, dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União, por meio de Convênios, Termos de Parceria, Termos de Cooperação – no caso das Instituições Federais – e Contrato de Repasse. Dessa forma, toda instituição pública ou privada que tiver interesse em receber recursos da União por meio de Convênios deverá se credenciar no Portal dos Convênios pelo sistema SICONV, e se dirigir a uma unidade cadastradora no estado em que estiver localizada.


Portanto, destaca-se Lei de Diretrizes Orçamentárias nº 12.017, de 12/08/09, que descreve as formas de transferências de recursos públicos para as Entidades Privadas sem Fins Lucrativos. Destaca-se ainda, o art. 25 da Lei Complementar nº 101/00, que diz respeito à comprovação da existência da previsão da contrapartida na lei orçamentária dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, onde são abordados, dentre outros, os percentuais da contrapartida, que levam em consideração os critérios, a localização regional das instituições proponentes. Em seguida, o art. 21, da Portaria 127/08 destaca a necessidade de um Plano de Trabalho que contemple os itens preenchidos no SICONV, quer seja: Justificativa para a celebração do instrumento; Descrição completa do objeto a ser executado; Descrição das metas a serem atingidas; Definição das etapas ou fases da execução; Cronograma de execução do objeto e cronograma de desembolso; Plano de aplicação dos recursos a serem desembolsados pela concedente e da contrapartida financeira do proponente.


Balanço do papel dos Indicadores na Formulação de Políticas, Programas e Projetos – Os Indicadores Sociais: Os indicadores são subsídios indispensáveis nos processos de tomada de decisão, nas fases de formulação e na implementação de políticas, programas e projetos. Constituem os instrumentos de descrição e medida: a) das atuais condições de uma dada realidade; b) das mudanças em curso ou resultantes da intervenção em uma dada realidade. Projeto: Seu conceito designa a unidade mínima de destinação de recursos que, por meio de um conjunto integrado de atividades, pretende transformar uma parcela da realidade, suprindo uma carência ou alterando uma situação-problema. Programa: Corresponde a um conjunto de projetos que visam aos mesmos objetivos e que “estabelece as prioridades da intervenção, identifica e ordena os projetos, define o âmbito institucional e aloca os recursos a serem utilizados”.


Balanço das Políticas Públicas de gênero e raça – Corresponde a inserir as perspectivas de gênero e raça no orçamento é, portanto, reflexo da preocupação em implementar tais políticas, garantindo os recursos para sua execução. Ao fazê-lo nominalmente nos orçamentos, os recursos destinados a estas políticas ficam alocados e, por conseguinte, autorizados. Sabe-se que isto não garante a sua execução, mas conforma um parâmetro, a partir do qual a sociedade tem condições de avaliar a atuação da gestão pública em sua implementação. É possível identificar os obstáculos, caso o recurso não seja liberado, apesar de sua política ter sido planejada e orçada. Esta situação significa que o orçamento não pode ser considerado apenas uma peça de cálculo de custos, mas um instrumento de monitoramento da sociedade sobre os gastos.


Uma ferramenta é fundamental para o planejamento da política pública a partir da perspectiva de gênero e raça, com base nestes princípios e diretrizes: o diagnóstico das desigualdades de gênero e raça. Assim, é possível identificar os acessos desiguais ao trabalho, à proteção social, aos recursos produtivos, à propriedade da terra, à moradia, à saúde, à justiça, aos bens e serviços necessários para uma vida digna, ao lazer, ao descanso, à participação política e ao poder, entre outros. Tais desigualdades devem ser alteradas pelas ações do poder público. Parte-se do reconhecimento de que toda política tem impacto sobre as relações de gênero e no enfrentamento ao racismo. Portanto, para realizar o diagnóstico, é preciso obter informação fidedigna sobre a desigualdade de gênero e raça, mediante dados desagregados por sexo e raça/cor. A chamada “cegueira de gênero” ou “cegueira para raça”, no planejamento das políticas públicas, ancora-se em categorias abstratas ou muito gerais de beneficiários/as e públicos-alvo de políticas públicas, como comunidade e família, que não permitem o reconhecimento das desigualdades de gênero e raça.


Balanço da Gestão do II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres – A concretização dos objetivos do PNPM exige o investimento de um montante expressivo de recursos não somente por parte da SPM, como também de outros ministérios e secretarias que desenvolvem ações específicas para a promoção da igualdade entre homens e mulheres ou que conseguem, nos programas existentes, tornar realidade a perspectiva da transversalização de gênero. Sendo assim, o II PNPM procura avançar nesta questão, trabalhando para que as ações apresentem um rebatimento orçamentário, tanto em termos de montante de recursos destinados quanto em relação à fonte desses recursos. Isto representa também uma inovação, pois cria a possibilidade de, pela primeira vez, se vislumbrar a estimativa global dos recursos destinados pelo governo federal às atividades voltadas para as mulheres.


Cadastro Único de Convênio (CAUC) – Criado pela Instrução Normativa (IN) nº 1, de 04/05/01, sucedida pela Instrução Normativa nº 1, de 17/10/05, ambas da Secretaria do Tesouro Nacional (STN). O CAUC consiste num subsistema desenvolvido dentro do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI), disponibilizado em rede a todas as unidades do governo federal e, na internet, no sítio da Secretaria do Tesouro Nacional.


Destra feita perfazem seus objetivos: 1. Simplificar a verificação, pelo/a gestor/a público do órgão ou entidade concedente, do atendimento pelo convenente e pelo ente federativo beneficiário de transferência voluntária de recursos da União, das exigências estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e demais legislação aplicável, reduzindo assim a burocracia desse processo e o volume de papéis, otimizando o arquivamento e o espaço físico para guarda. 2. Consolidar as exigências da Constituição Federal, da Lei de Responsabilidade Fiscal e de outras fontes legais e normativas necessárias à realização de transferências voluntárias. 3. Clarificar e precisar as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal, evitando-se dúvidas quanto à natureza dos documentos. 4. Ampliar o nível de controle de exigências, possibilitando transparência e exercício de cidadania, na medida em que permite o acesso pela internet. 5. Facilitar a entrega de documentação administrativa, financeira e contábil produzida pelo ente federativo, tais como Relatório de Gestão Fiscal, Relatório Resumido da Execução Orçamentária e Balanço Anual, considerando que o convenente entrega esses documentos uma única vez, e não mais como antes, nos diversos órgãos concedentes.


Compromisso ético – Corresponde ao conjunto de valores morais fundados na lisura e na honestidade, mas como uma atitude de comprometimento da/o gestora/o com os resultados efetivos das ações. Diagnóstico – Consiste na análise da situação-problema ou da realidade sobre a qual se pretende atuar. Essa análise subsidia a formulação de todas as etapas do projeto. Etapas – Cada meta está subdividida em etapas, que dizem respeito a cada uma das ações e atividades que devem acontecer para se atingir a meta. A etapa organiza o que será desenvolvido, e estabelece as prioridades de execução das diferentes partes até que se complete o todo e se realize a meta.


Indicadores – Há indicadores quantitativos e qualitativos. Fazem parte do processo de avaliação de uma política pública. São ferramentas de gestão e instrumentos de controle social que medem um fenômeno, suas alterações, podendo indicar a direção de mudanças necessárias. Os indicadores são elementos concretos, observáveis na realidade, que indicam a medida do sucesso ou do fracasso em relação a objetivos propostos e resultados esperados. A coleta de dados pode ser feita com base em dados federais, estaduais e municipais, por observação, questionários, grupos focais e entrevistas.


Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) – É o conjunto de leis que determina a responsabilidade para conduzir o orçamento público. Nela estão discriminadas as receitas e as despesas de uma administração para o ano fiscal. Orienta a elaboração da lei orçamentária anual, dispõe sobre as alterações na legislação tributária e estabelece a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento. É função da LDO adequar as diretrizes e os objetivos do PPA para o período de um ano, indicando as metas e as prioridades e orientando na elaboração do orçamento. É na LDO que ocorre a discussão em torno do cenário macroeconômico de receitas e despesas públicas, no qual se estabelecem a meta de superávit primário, os tetos para despesas e receitas, além dos critérios para contingenciamento.


Lei Orçamentária Anual (LOA) – Estima as receitas que a União deverá arrecadar e fixa as despesas públicas para cada ano. Ela contém o detalhamento da programação dos gastos públicos e deve ser compatível com o PPA, seguindo as orientações e as diretrizes definidas na LDO. A LOA compreende os orçamentos fiscal e de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maior parte do capital social, com direito a voto, além do orçamento da seguridade social.


Metas – Geralmente trazem números, porcentagens e prazos a serem atingidos. Portanto, devem-se ter metas para atingir determinado objetivo. Trazem conteúdos quantitativos e qualitativos. Entretanto, para sua realização devem-se executar algumas atividades. Monitoramento – É um processo permanente de coleta, análise e sistematização de informações e de verificação do andamento de um programa, em comparação com o desempenho pretendido.


Planejamento – Um plano contém os programas, que também abarcam os projetos. Portanto, é a soma dos programas que procuram objetivos comuns, ordena os objetivos gerais e os desagrega em objetivos específicos, que constituirão por sua vez os objetivos gerais dos programas. Ele determina o modelo de alocação de recursos resultante da decisão política e dispõe as ações programáticas em uma sequência temporal de acordo com a racionalidade técnica das mesmas e as prioridades de atendimento. Destaca-se a inclusão de estratégias, isto é, os meios estruturais e administrativos, assim como as formas de negociação, coordenação e direção (Cohen & Franco, 1993:86). Projetos sociais – Constituem uma forma de organizar ações para transformar determinada realidade social. São construções de um grupo de pessoas que deseja transformar boas ideias em boas práticas.


Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial (PLANAPIR) – Tem por propósito indicar aos estados brasileiros objetivos e metas a serem seguidos para superar as injustiças raciais existentes no país por meio da adoção de políticas de ações afirmativas, associadas às políticas universais. É composto por 12 eixos que se subdividem da seguinte forma: a) Eixos Setoriais - Trabalho e Desenvolvimento Econômico (Eixo 1); Educação (Eixo 2); Saúde (Eixo 3); Diversidade Cultural (Eixo 4); Direitos Humanos; Segurança Pública (Eixo 5); Desenvolvimento Social e Segurança Alimentar (Eixo 10); e Infraestrutura (Eixo 11); e b) Eixos Transversais: Comunidades Remanescentes de Quilombos (Eixo 6); Povos Indígenas (Eixo 7); Comunidades Tradicionais de Terreiro (Eixo 8); Política Internacional (Eixo 9); Juventude (Eixo 12).


Plano Plurianual (PPA) – É o principal instrumento de planejamento de médio prazo do governo brasileiro. É considerada a lei de maior alcance para o estabelecimento das prioridades e o direcionamento das ações do governo. O PPA é constituído basicamente por dois grandes módulos: a base estratégica e os programas. Consiste em um planejamento governamental de quatro anos, compreendendo o segundo ano do governo corrente e o primeiro ano do governo subsequente. Estabelece de forma regionalizada, as diretrizes, os objetivos e as metas da administração pública federal para as despesas de capital, para outras que decorrem delas e as referentes aos programas de duração continuada; Organiza em programas todas as ações desenvolvidas pela administração pública, assegurando seu alinhamento com a orientação estratégica e com as previsões de recursos; Desenvolve e aprimora o planejamento, o orçamento e a gestão por programas em todos os órgãos da administração pública; Torna pública informações referentes à execução dos programas de governo; Estimula a participação de outras esferas de governo e da iniciativa privada como fontes alternativas ao financiamento dos programas; Dota os administradores públicos de sistema gerencial estruturado e atualizado; Desenvolve a administração pública para definir responsabilidades e criar condições para a avaliação e a mensuração dos indicadores e dos efeitos dos programas sobre a sociedade.


Roteiro para elaboração de Projetos – Com vistas à elaboração de projetos, deve-se atender alguns objetivos descritos na ação escolhida, atentando para os critérios estabelecidos nas Chamadas Públicas, nas Normas Técnicas e nos Termos de Referência. Desta feita, as ações contidas no Plano Plurianual (PPA) indicam os objetivos a serem atingidos e norteiam as atividades a serem realizadas.


Por oportuno, identificam-se de forma sucinta, os itens necessários para a elaboração do Projeto Básico e do Plano de Trabalho com foco em gênero e raça, a saber: Para confecção do Projeto Básico, faz-se necessário, dentre outras, as características do projeto pretendido, indicação do Programa e Ação em que se insere a proposta, cronogramas físico e financeiro, valor da contrapartida financeira, já que se trata do local onde devem ser detalhadas todas as informações técnicas necessárias ao apoio financeiro. No que se refere ao Plano de Trabalho, importa algumas planilhas, que buscam contribuir para melhor planejar a implementação do projeto, já que traz os dados cadastrais da instituição proponente e um resumo do projeto, pois é a forma mais objetiva de apresentar o Projeto Básico.


Sustentabilidade – Consiste na relação que o projeto estabelece com a comunidade do seu entorno, cuja participação traz legitimidade ao projeto. É demonstrada também pela relação que ele estabelece com seus parceiros. Sustentabilidade é também a excelência da sua gestão financeira. Por fim, resta pontuar a inter-relação entre o texto e a atuação enquanto gestora. O movimento de luta pela transversalidade de gênero e raça na gestão pública elegeu como áreas prioritárias de atuação a “Elaboração de projetos e legislações”, focando discussões acerca dos conceitos que contribuíram para a técnica de elaboração de projetos vinculados à promoção da igualdade com recorte de gênero e raça.


De modo específico, ao analisarmos os documentos relativos aos direitos de mulheres e a negros/as, os roteiros para elaboração de projetos com recursos governamentais, além do Modelo de Plano de Ação do II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, nos deparamos com planos que resultam de um processo democrático, que envolveram uma participação expressiva de mulheres de todo o país. Como educadora e gestora, tenho o dever de disseminar o assunto a fim de desmistificar os conceitos ideológicos preconceituosos e discriminatórios vindouros e utilizados durante séculos, e que durante todo esse tempo tem contribuído para o fortalecimento das desigualdades.


Assim, entendendo que é através do trabalho e, principalmente da educação que poderemos alcançar melhores posições na sociedade, analisando situações que contribuíram para mudanças nas estatísticas atuais que demonstram que as minorias (étnicas e raciais) e grupos vulneráveis possuem os menores índices de escolaridade e condições sociais do país. Desse modo, ao estudar o ciclo das políticas públicas, abordamos a importância dos indicadores sociais na formulação de políticas, programas e projetos. Dessa forma, poderei abordar o temário em sala de aula, elevando a discussão através de debates, estudos de caso e participação ativa e coletiva dos atores envolvidos no ambiente educacional de modo a contribuir para o ideário de igualdade, respeitando a diversidade e as diferenças do país. 


Por conseguinte, quando aplicadas em classe, os dados estatísticos voltados para o tema favoreceram a busca por um novo paradigma, focado no estabelecimento de formas mais críticas de lidar com a questão da equidade de gênero. Isso sem deixar de lado o aspecto do respeito que o assunto preconiza, bem como a promoção de um ambiente reflexivo, na acepção de ampliar o repertório cultural do educando a partir da experiência com o outro.


*Texto adaptado do Fichamento Módulo V, unidade 4
Fonte: HEILBORN, Maria Luiza; ARAÚJO, Leila; BARRETO, Andreia. Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça – GPP – GeR: Módulo V. Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010.

Interface entre os Marcos históricos, conceituais e institucionais das Políticas Públicas de Gênero e Raça

*Henriqueta R. C. Froz


De modo pontual, a unidade 1 aborda o tema: “Marcos históricos, conceituais e institucionais das políticas públicas de gênero e raça”, focando discussões acerca dos conceitos que contribuíram para a formulação, o desenvolvimento da noção e das práticas em torno da cidadania, bem como, a indicação de atuação dos movimentos sociais na contemporaneidade.


Desse modo, a unidade em apreço teve como propósito abordar uma discussão sobre o processo de construção e a transversalidade de gênero e raça na gestão pública. De modo específico, a unidade 1 analisa o impacto da globalização nos Estados nacionais. Identifica ainda, como a sociedade pode ser incorporada à gestão das políticas públicas. Destaca quais as conferências tomar como referenciais para a elaboração de programas, projetos e ações com foco em gênero e raça. Monitora e avalia as políticas para as mulheres e qual o papel que as políticas de promoção da igualdade racial ocupam neste cenário. Desta feita, referenciam-se os principais conceitos apresentados na unidade em questão, a saber: 

Análise da Globalização e movimentos sociais Nesse cenário merece destaque o caráter transnacional da articulação dos movimentos, sua visibilidade e centralidade na agenda política da maioria dos países. Como exemplo dessa força política, temos as Conferências Internacionais sobre as Mulheres no México (1975), Nairóbi (1985) e Beijing (1995), de combate ao racismo, ao sexismo e à xenofobia (1978, 1983 e 2001), de direitos humanos em Viena (1993). Essas conferências articularam os Estados nacionais, o movimento global da sociedade civil, os ativistas dos direitos humanos das mulheres e de grupos étnico-raciais discriminados, entre outros, em um fórum único, para definir os marcos das políticas de direitos humanos, de gênero e de combate ao racismo. 

Estado- Providência – Corresponde a outra denominação para designar o Estado de Bem-Estar Social ou Welfare State, que por sua vez considera que os Estados garantem bens, serviços públicos e protegem a população em parceria com sindicatos e empresas privadas. 

Transversalidade de gênero e raça – Pressupõe a incorporação da perspectiva de gênero e de combate ao racismo em todas as políticas públicas propostas pelo Estado e desenvolvidas em cada área governamental e que tenham impacto no combate à pobreza e às desigualdades sociais e econômicas.

Accountability – Refere-se à ideia de responsabilização, controle e fiscalização dos agentes públicos. Trata-se de visibilizar as ações do Estado mediante a transparência na prestação de contas e no resultado das políticas públicas adotadas e implementadas. 

Análise do Estado mínimo – O Consenso de Washington é a denominação dada a uma articulação política para implantar o neoliberalismo de maneira ordenada nos diversos países, tendo como um de seus importantes objetivos o Estado Mínimo.  

Desta feita, representava uma corrente de pensamento na defesa de um conjunto de medidas técnicas em favor da economia de mercado, que visavam, em tese, à recuperação econômica dos países latino-americanos. Reuniram-se na capital americana em novembro de 1989, no International Institute for Economy, funcionários do governo dos EUA, dos organismos financeiros internacionais – FMI, Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID – e economistas latino-americanos, com o objetivo de avaliar as políticas econômicas implantadas até então e de projetar um conjunto de regras universais, explicitadas em dez pontos a saber: 

1. Disciplina fiscal, através da qual o Estado deve limitar seus gastos à arrecadação, eliminando o déficit público; 2. Focalização dos gastos públicos em educação, saúde e infraestrutura; 3. Reforma Tributária que amplie a base sobre a qual incide a carga tributária, com maior peso nos impostos indiretos e menor progressividade nos impostos diretos; 4. Liberalização financeira, com o fim das restrições que impeçam instituições financeiras internacionais de atuarem em igualdade com as nacionais, e o afastamento do Estado desse setor; 5. Taxa de câmbio competitiva; 6. Liberalização do comércio exterior, com redução de alíquotas de importação e estímulos à exportação, visando impulsionar a globalização da economia; 7. Eliminação de restrições ao capital externo, permitindo investimento direto estrangeiro; 8. Privatização, com a venda de empresas estatais; 9. Desregulação, com redução da legislação de controle do processo econômico e das relações trabalhistas; 10. Propriedade intelectual (Negrão, 1998, p. 41, 42). 

Nesse sentido, discutiam um conjunto de reformas essenciais para que a América Latina superasse a crise econômica e retomasse o caminho do crescimento. As conclusões desse encontro passaram a ser denominadas informalmente de Consenso de Washington, expressão atribuída ao economista inglês John Williamson.

Participação e controle social – Relaciona-se à participação da sociedade no acompanhamento e na verificação das ações da gestão pública na execução das políticas públicas, avaliando os objetivos, os processos e os resultados. As ideias de participação e controle social estão intimamente relacionadas por meio da participação na gestão pública, os cidadãos podendo intervir na tomada de decisão, orientando a Administração para que adote medidas que realmente atendam ao interesse público e, ao mesmo tempo, podendo exercer controle sobre a ação do Estado, exigindo que o gestor público preste contas de sua atuação.

Governabilidade – Diz respeito à capacidade da ação estatal na implementação das políticas e na consecução das metas coletivas.

Nacional-desenvolvimentismo – É o modelo de orientação econômica implementado no Brasil na Era Vargas (1930-1945), quando se desloca do modelo agroexportador do cultivo e da exportação do café para o modelo urbano-industrial, que promove a industrialização no país. Como foram feitos muitos investimentos no setor industrial brasileiro, ele se fortalece e se recupera antes de muitos países, depois da crise mundial de 1929 provocada pela quebra da Bolsa de Valores em Nova York e consequente quebra das economias mundiais, incluindo a brasileira. No Brasil, a industrialização passa a liderar o crescimento econômico e, a partir de 1937, são implantadas indústrias de base e empresas estatais para que o mercado seja abastecido com produção interna e não fique na dependência de importação de produtos como ferro, aço e outros. Começa a ser construída a siderúrgica de Volta Redonda e, na sequência, a Companhia Vale do Rio Doce. No Estado Novo (1937-1945), Vargas manteve o modelo de economia nacional-desenvolvimentista. 

Patrimonialismo – Seu conceito designa que o Estado não distingue os limites do que é público e do que é privado. No Brasil, o patrimonialismo existe desde o Estado Colonial português, que concedeu terras, títulos e poderes a vários “senhores”. Até os dias atuais, alguns políticos que ocupam cargos públicos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário consideram esse cargo como propriedade sua, de sua família e de seus amigos, na contramão dos interesses da população brasileira e do bem comum.

Conselhos - foram pensados a partir da Constituição Federal de 1988 (Título VIII) como mecanismos institucionais que visam garantir a participação da sociedade civil nos atos e nas decisões do Estado por meio de um processo de gestão conjunta das políticas. São órgãos colegiados com a incumbência de formular, supervisionar e avaliar políticas públicas; por isso importantes espaços de participação da sociedade civil na gestão pública.  

Os Conselhos Paritários são aqueles igualmente compostos de representantes do Poder Executivo (indicados/as por suas chefias) e da sociedade civil organizada (eleitos por seus pares). Os Conselhos Tripartites, como o Conselho do Trabalho, têm representantes, em igual número, do poder público, dos empregadores e dos empregados. Há Conselhos de Direitos, Conselhos de Políticas Públicas, Conselhos Gestores de Políticas Públicas Setoriais. Exemplos: Conselhos de Assistência Social; Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, e outros.  

Consulta pública – É um mecanismo para colher contribuições tanto de setores especializados quanto da sociedade em geral sobre as políticas e os instrumentos legais que irão orientar as diversas ações públicas no país. É um canal de participação democrática e transparente. As consultas públicas acontecem na elaboração de documentos e geralmente estão divididas por assunto. Há cadastro prévio do participante para comunicação posterior, se necessário, visando aos esclarecimentos e/ou à retirada de dúvidas acerca da contribuição. 

Efetividade – Correspondência entre os objetivos propostos e os resultados atingidos, ou seja, a relação entre os resultados (impactos observados) e os objetivos (impactos esperados). Eficácia – Grau de alcance das metas programadas em um determinado período de tempo, independentemente dos custos implicados. Está relacionada aos resultados sobre a população beneficiária e a sociedade. Eficiência – Relaciona-se à minimização dos custos e à maximização dos resultados. “Fazer mais com menos”. 

Intersetorialidade – Consiste na promoção de ações integradas entre diversos órgãos setoriais, com base na compreensão de que, isoladamente, um único órgão não consegue promover ações que abarquem a integralidade da demanda social. Cria espaços de comunicação e relação de instituições que atuam em diversos setores (político, técnico, administrativo etc.), em diferentes áreas (saúde, educação, meio ambiente, assistência social, planejamento etc.), e que podem pertencer a órgãos governamentais, não-governamentais, empresas e órgãos internacionais. Políticas públicas intersetoriais agregam setores diversos e várias áreas, permitindo melhor utilização de conhecimentos e experiências acumuladas, colaborando para o alcance de metas comuns, sob uma coordenação que agrega todas as contribuições.  

Nesse sentido, destaca-se um exemplo de gestão integrada de uma política social é o Programa Bolsa Família: “além do alívio imediato da pobreza por meio da transferência direta de renda, o programa apoia o exercício de direitos sociais básicos na área da saúde e educação, atuando em coordenação com programas complementares que têm por objetivo o desenvolvimento das famílias, como os programas de geração de trabalho e renda, de alfabetização de adultos e de fornecimento de registro civil” (Estevão de Moraes, 2009). 

Ouvidoria – O ouvidor é um profissional que está cada vez mais presente em organizações públicas e privadas, atuando como representante dos cidadãos, dos clientes junto à instituição. Na administração pública a função do ouvidor é defender os cidadãos cujos direitos foram prejudicados ou ameaçados por atos da administração. Qualquer cidadão, seja cliente interno ou externo, pode apresentar, sem ônus ou embaraço burocrático, reclamação direta ao ouvidor, verbalmente ou por escrito. O ouvidor não possui poder de decisão. O poder do ouvidor é de persuasão e de recomendação, no sentido de reformulação das decisões sempre que houver prejuízo ou constrangimento para o cliente. Para exercer com eficiência a sua função, o ouvidor tem que ter o apoio da direção da organização, livre trânsito no âmbito institucional e prioridade de resposta. No Brasil, a função do ouvidor baseia-se nos princípios constitucionais, estabelecidos no art. 37, que são legalidade, legitimidade, imparcialidade, moralidade, probidade e publicidade, e segue a orientação sistêmica da Ouvidoria Geral da República. 

Golpes de Estado (Golpe no Chile) – Golpe de Estado ocorrido em 11 de setembro de 1973, que juntou a Marinha, o Exército e organizações terroristas neofascistas chilenas, com apoio militar e financeiro dos EUA e CIA com intuito de derrubar o presidente Salvador Allende. Foi coordenado pelo general Augusto Pinochet que se proclamou Chefe Supremo da Nação, declarando estado de guerra. Allende havia sido eleito com a proposta de um regime socialista para o Chile, por meios pacíficos, democráticos, respeitando a Constituição e as liberdades. Allende assumiu o poder com grande apoio popular, mas com grupos de opositores radicais e sem maioria no Congresso. Aos EUA não era conveniente que houvesse mais um país socialista nas Américas.  

O clima no país era quase de guerra civil, com os grupos radicais de esquerda e direita se confrontando e praticando atos terroristas. Allende solicitou a declaração de estado de sítio, mas a Câmara de Deputados se recusou. Ele então convocou a colaboração dos ministros militares para garantir a ordem constitucional. No dia 11 de setembro a esquadra chilena, com a retaguarda da norte-americana, tomou a cidade de Valparaíso, supervisionados por 33 caças e aviões da força aérea norte-americana que estavam na fronteira com a Argentina. Allende foi alertado do golpe e procurou por Pinochet, até então seu colaborador, mas que já participava do golpe.  

Assim, o Comando de Comunicações do Exército solicitou a Allende a entrega do cargo e a saída da sede do governo, La Moneda, sob ameaça de ataques por terra e mar. Allende decidiu permanecer no palácio, que foi bombardeado com muita violência, e ele foi executado, ainda que haja uma versão de suicídio. Pinochet governou de 1973 a 1990. Ao assumir o poder, Pinochet adotou imediatamente um plano econômico neoliberal preparado pelo candidato de direita que havia concorrido com Allende. O plano havia sido concebido com o apoio de um grupo de economistas, chamados pela imprensa internacional da época de “os Chicago Boys”. Houve repressão sindical, liberalização da economia, privatização dos bens públicos, o que resultou na concentração de renda e altas taxas de desemprego. 

MERCOSUL – Designação dada ao Mercado Comum do Sul. Sua criação deu-se em 26/03/1991 com a assinatura do Tratado de Assunção, no Paraguai, com o objetivo de fortalecer e desenvolver economicamente o bloco da América do Sul e facilitar as relações comerciais com outros blocos econômicos, como o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (em inglês: North American Free Trade Agreement) – NAFTA e a União Europeia. São membros: Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai. São Estados associados: Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru, Venezuela. E é Estado observador o México. Desde 1995 foi instalada a zona de livre comércio entre os países membros e 90% das mercadorias produzidas nos países membros podem ser comercializadas sem tarifas comerciais. Alguns produtos não fazem parte do acordo por serem considerados estratégicos. Ainda hoje há dificuldades nas relações comerciais entre os países do bloco. 

Balanço dos Planos Nacionais de Políticas para as Mulheres (PNPM I e II) – Foram lançados em dez/2004. São Planos que resultam de um processo democrático, que envolveu uma participação expressiva de mulheres de todo o país, em conferências municipais, estaduais e na I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres. Por fim, aprovaram-se os princípios da Política Nacional para as Mulheres e diversas diretrizes que fornecem orientação às políticas públicas de diferentes instâncias governamentais, cabendo ao PNPM II validar os princípios e diretrizes do PNPM I na II Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres. 

Políticas Públicas- Podem ser compreendidas como um instrumento de execução dos planos e programas que orientarão a ação do poder executivo e através do qual os/as governantes intervirão na sociedade. Nesse sentido, conforme preceitos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa Gomes em 2001:

“(...) um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego (Gomes, 2001: p.40).

Desta feita, as políticas públicas são diretrizes que devem estar alicerçadas em princípios, tendo por finalidade subsidiar a ação do poder público.

Políticas de Governo – Diz respeito a políticas de organização e gestão de certo governo em um determinado período. Compreendem políticas que visam atender, em sua maioria, necessidades definidas na própria agenda política interna. São aquelas que o Executivo decide num processo bem mais elementar de formulação e implementação de determinadas medidas, para responder às demandas colocadas na própria agenda política interna – pela dinâmica econômica ou política-parlamentar, por exemplo – ou vindos de fora, como resultado de eventos internacionais com impacto doméstico. 

Políticas de Estado – São políticas elaboradas de forma mais racionalizada. Sua implantação é mais demorada e complexa. Deve ser voltada para o interesse geral da população. Envolvem as burocracias de mais de uma agência do Estado, e acabam passando pelo Parlamento ou por instâncias diversas de discussão, depois que sua tramitação dentro de uma esfera da máquina do Estado envolveu estudos técnicos, simulações, análises de impacto horizontal e vertical, efeitos econômicos ou orçamentários, quando não um cálculo de custo-benefício levando em conta a trajetória completa da política que se pretende implementar. 

Balanço das Políticas locais de promoção da igualdade de gênero – É fundamental a elaboração e as adesões municipais aos Planos Estaduais de Políticas para as Mulheres, pois destacam a importância de mecanismos institucionais descentralizados, responsáveis por políticas, planos e programas que, em cooperação com organizações não-governamentais, contribuam para o efetivo estabelecimento da igualdade dos gêneros. 

Balanço da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) – É tido como o primeiro órgão para as mulheres, em nível federal, com status de ministério. Tem como função fomentar estratégias para o desenvolvimento de políticas para as mulheres e tem como atribuições propor, coordenar e articular um conjunto de políticas públicas dirigidas à eliminação de todas as formas de discriminações de gênero, a consolidação de plenos direitos humanos e cidadania para as mulheres. Cita-se, para efeito, algumas políticas públicas executadas pela SPM, quer seja garantir às mulheres, sem distinção de raça, etnia, orientação sexual, entre outras, acesso aos cargos de chefia, igualdade de tratamento, de remuneração e de oportunidades. 

Balanço da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) – Órgão responsável pela formulação, coordenação e articulação de políticas e diretrizes para a promoção da igualdade racial e proteção dos direitos dos grupos raciais e étnicos discriminados, com ênfase na população negra. A SEPPIR norteia seus estudos no racismo e nas desigualdades étnico-raciais como elementos fundantes do Estado brasileiro, pois as estruturas da vida social, da produção e da apropriação de bens (materiais e simbólicos) são permeadas por essas esferas. A ênfase na população negra é decorrente também do fato de este ser o primeiro grupo étnico-racial a se organizar politicamente no país, com vistas a promover a superação do racismo. 

Nesse cenário, destaca-se como elementos favoráveis à luta antirracismo no país, o reconhecimento do direito de posse da terra às comunidades quilombolas e a criminalização da discriminação racial. Outro ponto que merece destaque foi a Marcha Zumbi dos Palmares contra o Racismo, pela Cidadania e a Vida aconteceu em Brasília/1995 em comemoração aos 300 anos da morte de Zumbi dos Palmares, maior símbolo da luta dos/as negros/as no Brasil. Participaram 30 mil ativistas negros vindos de todos os cantos do país. Na ocasião, foi entregue ao presidente um documento com as principais reivindicações do Movimento Negro, denunciando o racismo, defendendo a inclusão de negros/as na sociedade brasileira e apresentando propostas concretas de políticas públicas.  

Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial (PLANAPIR) – Tem por propósito indicar aos estados brasileiros objetivos e metas a serem seguidos para superar as injustiças raciais existentes no país por meio da adoção de políticas de ações afirmativas, associadas às políticas universais. É composto por 12 eixos que se subdividem da seguinte forma: a) Eixos Setoriais - Trabalho e Desenvolvimento Econômico (Eixo 1); Educação (Eixo 2); Saúde (Eixo 3); Diversidade Cultural (Eixo 4); Direitos Humanos; Segurança Pública (Eixo 5); Desenvolvimento Social e Segurança Alimentar (Eixo 10); e Infraestrutura (Eixo 11); e b) Eixos Transversais: Comunidades Remanescentes de Quilombos (Eixo 6); Povos Indígenas (Eixo 7); Comunidades Tradicionais de Terreiro (Eixo 8); Política Internacional (Eixo 9); Juventude (Eixo 12). 

Diante desse cenário, faz-se necessário ainda, explicitar a relação existe entre o que o texto problematiza e a sua atuação enquanto gestor/a. Assim, o movimento de luta pela transversalidade de gênero e raça na gestão pública elegeu como áreas prioritárias de atuação o processo de transformação das políticas públicas no Estado brasileiro a partir da perspectiva da transversalidade, da intersetorialidade e da interseccionalidade, precisamente no que se refere à influência dos movimentos sociaisComo educadora e gestora, tenho o dever de disseminar o assunto a fim de desmistificar os conceitos ideológicos discriminatórios e preconceituosos utilizados durante séculos, e que durante todo esse tempo tem contribuído para o fortalecimento das desigualdades.  


Assim, entendendo que é através do trabalho e, principalmente da educação que poderemos alcançar melhores posições na sociedade, analisando situações que contribuíram para mudanças nas estatísticas atuais que demonstram que as minorias (étnicas e raciais) e grupos vulneráveis possuem os menores índices de escolaridade e condições sociais do país. Dessa forma, poderei contribuir para o ideário de igualdade, respeitando a diversidade e as diferenças do país.  

Quando aplicadas em classe, os dados estatísticos voltados para o tema favorecem a busca por um novo paradigma, focado no estabelecimento de formas mais críticas de lidar com a questão da equidade de gênero. Isso sem deixar de lado o aspecto do respeito que o assunto preconiza, bem como a promoção de um ambiente reflexivo, na acepção de ampliar o repertório cultural do educando a partir da experiência com o outro. 

Por oportuno, após a sistematização da unidade, resta expressar a ideia ocorrida e sua convergência em relação ao seu trabalho. Contemporaneamente, no processo de construção da sociedade civil, a Escola enquanto aparelho ideológico, prima por atividades didáticas que favorecerão a busca por um novo paradigma, focadas no estabelecimento de análises críticas da diversidade. Como educadora, penso o cotidiano educacional como o meio de propagação de movimentos sociais na luta por direitos e conquistas de equidade de gênero. Devendo propor mudanças em prol da promoção de um ambiente reflexivo, analisando os marcos históricos, conceituais e institucionais das políticas públicas de gênero e raça, ampliando a cultura do educando a partir da experiência e convivência com o outro. 

Desta feita, despertou-me a ideia de Projeto educacional, através de seminários e palestras focais, destinado a comunidade escolar (educadores, alunos e comunidade), com o objetivo de contribuir para a identificação da atual configuração da sociedade civil, refletindo sobre qual o papel que os movimentos sociais e as organizações (governamentais ou não) ocupam neste cenário. 

A princípio, é preciso esclarecer a existência do problema, as contradições entre o processo pleno de transformação das políticas públicas a partir da perspectiva da transversalidade, da intersetorialidade e da interseccionalidade. Apresentar alguns casos de preconceitos vivenciados em determinados grupos, enfocando a crueldade de se dividir a sociedade por abismos de oportunidades e condições. É necessário também, enfatizar os indicadores que apontam avanços nos índices de inclusão social, educacional e no mercado de trabalho, por parte desses grupos. Cabe ainda, destacar que é papel de todo cidadão, lutar pela igualdade e respeito às diferenças, independente de condições, oportunidades e conquistas. Após explanação do conteúdo, solicitar, sugestões para implementação de ações práticas no sistema educacional. Assim, a Escola cumprirá efetivamente o disposto em Lei e contribuirá para a promoção do ideário de igualdade de gênero.  

*Texto adaptado do Fichamento Módulo V, unidade 1
Fonte: HEILBORN, Maria Luiza; ARAÚJO, Leila; BARRETO, Andreia. Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça – GPP – GeR: Módulo V. Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Considerações sobre a Lei Maria da Penha – Lei 11.340/06


*Henriqueta R. C. Froz

Segundo os preceitos de Alves (2006), ficou conhecida como Maria da Penha em homenagem à biofarmacêutica citada anteriormente, que no ano de 1983 foi vítima de uma tentativa de homicídio por seu ex-marido. A lei sancionada no dia 7 de agosto de 2006, de acordo com o art. 1°, das disposições preliminares, cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

A lei, em sua forma de aplicação, é vista como mecanismo que encoraja as mulheres a denunciar e formalizar as agressões ou outros tipos de violência sofrida. Ela prevê medidas cuja função é protegê-las quando em situação de violência ou ameaçadas de morte, como, por exemplo, o afastamento compulsório do agressor, que passa a não poder se aproximar da vítima e dos filhos, se o tiverem.

Em termos gerais, a lei tipifica e define a violência doméstica e familiar contra a mulher, determinando que esta pode ser tanto física, quanto psicológica, sexual, patrimonial e/ou moral. Também estabelece que esta violência independe da orientação sexual, significando dizer que pode ocorrer dentro da esfera de uma conjugalidade homoafetiva.

Seu art. 5º permite uma interpretação de reconhecimento da entidade familiar entre pessoas do mesmo sexo. Determina que uma possível renúncia à denúncia, por parte da vítima, só poderá ocorrer perante o juiz, extingue as penas pecuniárias e permite que bens, possivelmente retirados por meio de procurações, possam ser reavidos. Em caso de decisão pela detenção do agressor, a pena é triplicada, passando de seis meses a um ano (Lei n° 9.099/95), para no mínino três meses e no máximo três anos. Determina que a vítima seja notificada dos atos processuais como, por exemplo, ingresso e saída do agressor da prisão.

Retira dos juizados especiais criminais a competência para julgar este tipo de crime e determina a criação de juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher com competência cível e criminal para abranger as questões de família decorrentes da violência contra a mulher. Altera o código de processo penal para possibilitar ao juiz a decretação da prisão preventiva quando houver riscos à integridade física ou psicológica da mulher e modifica a lei de execuções penais para permitir ao juiz que determine o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.

Por fim, prevê que, no caso de violência doméstica cometida contra mulher com deficiência, a pena seja aumentada em um terço. Quanto à sua aplicação, prevê um capítulo específico para o atendimento dos casos de violência doméstica contra a mulher, permitindo que a autoridade policial prenda o agressor em flagrante sempre que houver qualquer uma das formas de violência doméstica contra a mulher.

Além de uma maior severidade em relação ao agressor, a lei estabelece medidas de assistência social às mulheres vítimas de violência. Isto significa que podem ser cadastradas nos programas de assistência social dos governos federais, estaduais e municipais. Esta lei, entretanto, não é vista de forma unânime dentro do campo jurídico brasileiro. Existem vozes dissonantes, umas que apregoam o seu caráter positivo, outras, seu caráter negativo e/ou sua inconstitucionalidade. Os que a vêem positivamente consideram-na um mecanismo de diminuição da impunidade da violência doméstica, produzida pelo processamento judicial a partir da edição da lei nº 9.099/95.

Segundo esta ótica, a lei nº 9.099/95, ao atribuir aos Juizados Especiais Criminais a competência para processar o crime de menor potencial ofensivo, promoveu um abrandamento das penas por meio de restituição do dano através de pagamento em cesta básica ou de prestação de serviços à comunidade. O que é entendido, por parcela do campo jurídico, como uma banalização da violência doméstica e um desestímulo às vítimas em denunciar esses crimes, gerando nos agressores um sentimento de impunidade. Os que pensam sobre o caráter negativo da lei 11.340/06 apregoam-na como um retrocesso histórico nas questões de política criminal, por ofender os primados que irradiam da Justiça Restaurativa.

Segundo Silva (2007), esse modelo é pensado para corrigir distorções da Justiça Retributiva. Sua finalidade última é a punição do delinqüente e estrutura-se em um processo penal que vê o delito como ataque a ordem social e ao Estado, sem, no entanto, se preocupar com os interesses da vítima. Em oposição, a Justiça Restaurativa, segundo Silva (2007), pauta-se numa lógica de consenso dentro da qual vítima, agressor e membros da sociedade afetados por um crime participam juntos na construção da restauração dos danos provocados pelo crime.

No Brasil, conforme preceitos de Silva (2007), o Juizado Especial Criminal, concebido pela lei n.° 9.099/95, representou a adoção das práticas restaurativas, por situar, no processo penal, a vítima e o autor como peças centrais na resolução do problema. No entanto, a lei Maria da Penha é vista como promotora de uma ruptura na adoção de práticas restaurativas por “vedar a composição civil dos danos” no curso do processo, por impedir a renúncia ao direito de queixa ou de representação nos crimes de “ação pública condicionada”, tornando assim os crimes de lesão corporal leve e culposa de “ação penal pública incondicionada”.

Dentro desta ótica, a referida lei estaria sendo contrária à Constituição Federal, propondo tratamento desigual para homens e mulheres perante a família, perante o Estado e perante a Lei. De acordo com Pinheiro (2007), uma lei que dá margem para que seja considerado menos danoso o fato de um filho, com 18 anos de idade, agredir o pai do que ferir a mãe contraria sobremaneira o princípio da igualdade. Da mesma forma, permitir o entendimento de que haveria mais gravidade no fato de um pai se exceder nos meios disciplinares contra uma filha do que contra um filho do sexo masculino estaria ferindo os princípios constitucionais.

Diante desse cenário, importa pensar que, por mais que a sociedade Ocidental tenha se transformado em função de uma ideologia da igualdade entre os gêneros, permanece, no plano das relações sociais, uma desigualdade de poderes entre o universo masculino e feminino, que resguarda o lugar de dominação para o primeiro e de subordinação ao segundo. Sendo assim, é relevante a criação de mecanismos que, de forma “artificial”, possam promover uma mudança nessas relações, mesmo que, em um primeiro momento, o façam de uma forma compensatória.
 
*Texto adaptado de Alessandra de A. Rinaldi
Fonte: http://www.estacio.br/publicacoes/direitovivo/pdf/Artigo_Menezes.pdf. Acesso em: 25 de maio de 2012.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Ele ensina os machões a serem 'bons maridos'


VALÉRIA FRANÇA - O Estado de S.Paulo

Todas as segundas-feiras, um grupo de aproximadamente dez homens se reúne em um sobrado de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo. Com profissões e escolaridade distintas, eles têm em comum um histórico de agressões físicas e psicológicas contra mulheres.
Barbosa trabalha há duas décadas pela igualdade de gêneros - JF Diorio/AE
JF Diorio/AE

Na coordenação desse grupo está o brasiliense Sergio Barbosa, de 45 anos, professor de Sociologia e Filosofia, que depois de muitas andanças pelo Brasil, se estabeleceu em São Paulo. Filho de militar baiano com uma dona de casa capixaba, trabalha há duas décadas pela igualdade de gêneros. Desde 2006, é voluntário do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, organização não governamental que pegou um caminho alternativo para tentar cortar o ciclo da violência contra a mulher: o de reeducar os homens.

Caminho no qual a Justiça também acredita. Desde 2010, a Vara Central da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de São Paulo, na Barra Funda, zona oeste, direciona os homens agressores para a ONG. "Eles chegam bravos, odiando a ideia de estar em um grupo de homens organizado em um coletivo feminista", diz Barbosa.

"Sou amasiado e estou aqui por brigas antigas. A juíza me condenou a participar", diz um motorista de 35 anos, integrante do grupo. "No início, eles se sentem injustiçados. Acham que não fizeram nada de mais", explica Barbosa, que com o resto da equipe faz uma série de atividades para desconstruir a figura do machão controlador.

"Tentamos mostrar que para ser homem não é necessário bancar o durão violento. Ajudar na educação dos filhos e mesmo nas tarefas do lar não afeta a masculinidade", diz Leandro Feitosa Andrade, de 52 anos, professor de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), outro voluntário do Coletivo que trabalha com Barbosa na reeducação dos homens.

Todos os orientadores são homens. No caso de Barbosa, ele parece ter sido escolhido a dedo. Antes de se formar em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, trabalhou no garimpo em Xambioá, município do estado do Tocantins. Homem de traços rústicos, provoca empatia imediata nos integrantes do grupo, conhece a realidade desse público, e não se choca à toa.

"Meu pai queria que fizesse ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica). Eu até passei no exame, mas ansiava por outra vida. Fui ganhar dinheiro no garimpo." Aos 20 anos veio para São Paulo, entrou na PUC, e engatou numa ação comunitária com prostitutas, garotos de programas e travestis na zona leste da cidade. Daí para o trabalho pela igualdade de gênero foi um pulo.

Ao todo, são 16 encontros semanais. No início, os homens se apresentam e contam suas histórias. Os motivos para a violência são quase sempre os mesmos: sentimento de posse, ciúmes, educação dos filhos e machismo. "Acham que só eles podem fazer determinadas coisas, como trabalhar e não cuidar das tarefas domésticas ou sair com os amigos para uma noitada. Quando são desafiados, partem para agressão", diz Barbosa, que entende bem sobre negociações em família. Casado com uma médica infectologista, é pai de três filhos - Juliana, de 15 anos, Lucas, de 14 anos, e Sarah, de 4 anos.

Escolaridade. Nenhum agressor aceita ser colocado em xeque, independentemente do grau de escolaridade. "No grupo, muitos frequentadores têm curso superior e acreditam que são representantes da honra e do poder." Um comportamento que, segundo ele, se repete em outros ambientes como nas universidades. "Há muitos casos de mulheres que foram drogadas porque os parceiros queriam sexo e elas, não. O estupro não é denunciado." Barbosa dá aula de Filosofia e Sociologia nas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), na Liberdade, centro de São Paulo.

Para mudar tantos preconceitos, vale tudo: psicodrama, palestras e atividades paralelas. "Dizer que a cada 15 segundos uma mulher é agredida não sensibiliza o homem. É preciso chamá-lo para a responsabilidade." No grupo, o depoimento de agressores com passagem pela prisão tem efeito moral sobre os demais. "Fiquei 115 dias preso. Lá dentro é cruel, principalmente para a gente, que não é bandido, que é trabalhador. Se puder evitar...", diz um jovem do grupo, de 19 anos.

Noções de direitos humanos e da Lei Maria da Penha também fazem parte do programa. A ideia é acabar com o sentimento de impunidade. Questões de saúde sexual, como a importância do uso da camisinha, também são abordadas. "Tem homem que acha que mulher que carrega camisinha na bolsa é vagabunda", afirma Barbosa.

Academia de Polícia. Alguns alunos frequentam também o curso da Academia de Polícia de São Paulo, batizado de Projeto de Reeducação Familiar, constituído de seis encontros mensais com palestras. "O projeto é fruto de um Termo de Cooperação entre a Secretaria da Segurança Pública, a Polícia Civil, a Academia de Polícia, a Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania e o Ministério Público Estadual", explica a juíza Elaine Cristina Monteiro Cavalcante, da Vara Central da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de São Paulo.

Trata-se de um curso mais recente do que o do Coletivo, porém com uma infraestrutura maior, com profissionais contratados - na ONG, o trabalho é voluntário. "O critério de encaminhamento aos dois projetos é, basicamente, a conveniência de dias e horários. A frequência não pode atrapalhar o emprego de cada agressor", explica Elaine.

"De cada cem agressores que passam pelo Coletivo", segundo Barbosa, "apenas dois reincidiram." A Justiça quer aumentar o número de cursos, porque a demanda de "alunos" deve crescer. Em dezembro de 2010, foram criadas na cidade mais seis varas especializadas na Lei Maria da Penha. Só em abril, 60 homens são esperados para uma mega-audiência na Barra Funda.

Sergio Barbosa é o coordenador do primeiro grupo de SP feito para mudar o comportamento de homens agressores.