Segundo os preceitos de Alves
(2006), ficou conhecida como Maria da Penha em homenagem à biofarmacêutica
citada anteriormente, que no ano de 1983 foi vítima de uma tentativa de
homicídio por seu ex-marido. A lei sancionada no dia 7 de agosto de 2006, de
acordo com o art. 1°, das disposições preliminares, cria mecanismos para coibir
a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art.
226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas
de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir,
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos
Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece
medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência
doméstica e familiar.
A lei, em sua forma de aplicação,
é vista como mecanismo que encoraja as mulheres a denunciar e formalizar as
agressões ou outros tipos de violência sofrida. Ela prevê medidas cuja função é
protegê-las quando em situação de violência ou ameaçadas de morte, como, por
exemplo, o afastamento compulsório do agressor, que passa a não poder se aproximar
da vítima e dos filhos, se o tiverem.
Em termos gerais, a lei tipifica
e define a violência doméstica e familiar contra a mulher, determinando que
esta pode ser tanto física, quanto psicológica, sexual, patrimonial e/ou moral.
Também estabelece que esta violência independe da orientação sexual, significando
dizer que pode ocorrer dentro da esfera de uma conjugalidade homoafetiva.
Seu art. 5º permite uma
interpretação de reconhecimento da entidade familiar entre pessoas do mesmo
sexo. Determina que uma possível renúncia à denúncia, por parte da vítima, só
poderá ocorrer perante o juiz, extingue as penas pecuniárias e permite que
bens, possivelmente retirados por meio de procurações, possam ser reavidos. Em
caso de decisão pela detenção do agressor, a pena é triplicada, passando de
seis meses a um ano (Lei n° 9.099/95), para no mínino três meses e no máximo
três anos. Determina que a vítima seja notificada dos atos processuais como,
por exemplo, ingresso e saída do agressor da prisão.
Retira dos juizados especiais
criminais a competência para julgar este tipo de crime e determina a criação de
juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher com
competência cível e criminal para abranger as questões de família decorrentes
da violência contra a mulher. Altera o código de processo penal para
possibilitar ao juiz a decretação da prisão preventiva quando houver riscos à
integridade física ou psicológica da mulher e modifica a lei de execuções
penais para permitir ao juiz que determine o comparecimento obrigatório do
agressor a programas de recuperação e reeducação.
Por fim, prevê que, no caso de
violência doméstica cometida contra mulher com deficiência, a pena seja
aumentada em um terço. Quanto à sua aplicação, prevê um capítulo específico para
o atendimento dos casos de violência doméstica contra a mulher, permitindo que
a autoridade policial prenda o agressor em flagrante sempre que houver qualquer
uma das formas de violência doméstica contra a mulher.
Além de uma maior severidade em
relação ao agressor, a lei estabelece medidas de assistência social às mulheres
vítimas de violência. Isto significa que podem ser cadastradas nos programas de
assistência social dos governos federais, estaduais e municipais. Esta lei,
entretanto, não é vista de forma unânime dentro do campo jurídico brasileiro.
Existem vozes dissonantes, umas que apregoam o seu caráter positivo, outras, seu
caráter negativo e/ou sua inconstitucionalidade. Os que a vêem positivamente consideram-na
um mecanismo de diminuição da impunidade da violência doméstica, produzida pelo
processamento judicial a partir da edição da lei nº 9.099/95.
Segundo esta ótica, a lei nº
9.099/95, ao atribuir aos Juizados Especiais Criminais a competência para processar
o crime de menor potencial ofensivo, promoveu um abrandamento das penas por meio
de restituição do dano através de pagamento em cesta básica ou de prestação de serviços
à comunidade. O que é entendido, por parcela do campo jurídico, como uma banalização
da violência doméstica e um desestímulo às vítimas em denunciar esses crimes, gerando
nos agressores um sentimento de impunidade. Os que pensam sobre o caráter
negativo da lei 11.340/06 apregoam-na como um retrocesso histórico nas questões
de política criminal, por ofender os primados que irradiam da Justiça
Restaurativa.
Segundo Silva (2007), esse modelo
é pensado para corrigir distorções da Justiça Retributiva. Sua finalidade
última é a punição do delinqüente e estrutura-se em um processo penal que vê o delito
como ataque a ordem social e ao Estado, sem, no entanto, se preocupar com os interesses
da vítima. Em oposição, a Justiça Restaurativa, segundo Silva (2007), pauta-se numa
lógica de consenso dentro da qual vítima, agressor e membros da sociedade
afetados por um crime participam juntos na construção da restauração dos danos
provocados pelo crime.
No Brasil, conforme preceitos de Silva
(2007), o Juizado Especial Criminal, concebido pela lei n.° 9.099/95,
representou a adoção das práticas restaurativas, por situar, no processo penal,
a vítima e o autor como peças centrais na resolução do problema. No entanto, a
lei Maria da Penha é vista como promotora de uma ruptura na adoção de práticas
restaurativas por “vedar a composição civil dos danos” no curso do processo,
por impedir a renúncia ao direito de queixa ou de representação nos crimes de
“ação pública condicionada”, tornando assim os crimes de lesão corporal leve e
culposa de “ação penal pública incondicionada”.
Dentro desta ótica, a referida
lei estaria sendo contrária à Constituição Federal, propondo tratamento desigual para
homens e mulheres perante a família, perante o Estado e perante a Lei. De acordo
com Pinheiro (2007), uma lei que dá margem para que seja considerado menos
danoso o fato de um filho, com 18 anos de idade, agredir o pai do que ferir a
mãe contraria sobremaneira o princípio da igualdade. Da mesma forma, permitir o
entendimento de que haveria mais gravidade no fato de um pai se exceder nos
meios disciplinares contra uma filha do que contra um filho do sexo masculino
estaria ferindo os princípios constitucionais.
Diante desse cenário, importa pensar
que, por mais que a sociedade Ocidental tenha se transformado em função de uma
ideologia da igualdade entre os gêneros, permanece, no plano das relações
sociais, uma desigualdade de poderes entre o universo masculino e feminino, que
resguarda o lugar de dominação para o primeiro e de subordinação ao segundo.
Sendo assim, é relevante a criação de mecanismos que, de forma “artificial”,
possam promover uma mudança nessas relações, mesmo que, em um primeiro momento,
o façam de uma forma compensatória.
*Texto adaptado de Alessandra de A. Rinaldi
Fonte: http://www.estacio.br/publicacoes/direitovivo/pdf/Artigo_Menezes.pdf. Acesso em: 25 de maio de 2012.
Fonte: http://www.estacio.br/publicacoes/direitovivo/pdf/Artigo_Menezes.pdf. Acesso em: 25 de maio de 2012.
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