domingo, 11 de dezembro de 2011


Depoimento de um Negro que vive há 26 anos entre os pomeranos de Melgaço
                                                                             Edir Marli Föeger
Eu vim para cá através do meu irmão que trabalhava aqui, gostei muito do lugar, também gostava de jogar bola, logo fiz amizades.
Já ocorreram várias situações onde as pessoas me olhavam diferente, e faziam comentários, por estranhar a minha cor. Lembro da época quando cheguei aqui tinha um senhor que tinha terra perto onde eu tava ficando, ele dizia que não dava serviço para o preto, depois de um tempo, quando viu que eu trabalhava muito, ele me procurou pra trabalhar pra ele.
Outro coisa que lembro que aconteceu num dia que estava na casa de um amigo, aí chegou um senhor pra convidar ele para o casamento, quando saiu ele disse em pomerano “Kai schuat mit brinha” (não trazer preto junto) e eu entendi o que ele disse, eu já aprendi um pouco pela convivência, e eu respondi a ele “não se preocupe, gosto muito daqui, das festa, mas eu não vou desconvidado”.
Outra situação que aconteceu foi quando fui convidado pelo senhor XXXXX para o casamento de bodas de prata dele, eu fiquei feliz e fui no casamento, quando cheguei lá fui cumprimentar o casal, a esposa dele, que não me conhecia, chamou ele de lado e disse: “pra que você convidou esse homem preto pra vir aqui na nossa festa, ele vai arrumar confusão e problema pra gente”. Tempos depois comprei terra perto da casa deles e agora ela se arrepende do que ela disse no dia.
Isso foram coisas que aconteceram comigo. Pode até ser que isso seja preconceito, mas eu não levo isso como um preconceito que eles têm por mim, eu não tenho muito estudo, eu sei que os negros já sofreram muito, mas eu sempre me dei bem aqui. Já ouvi muitos negros falarem que não ficam aqui no meio dos pomeranos eles dizem que pomerano não gosta de preto, porém é o contrário, é só conquistar a confiança e ter respeito.
As vezes vou em algumas festas aqui dos pomeranos e só tem eu de negro, as pessoas olham muito pra mim, mas eu não ligo eu gosto dos pomeranos, não acho que sou discriminado, sempre tive respeito e todos me respeitam, consegui fazer uma grande amizade com esse povo.
A questão de ficar desconfiado acho que é normal, hoje todos nós devemos ficar desconfiado de pessoas estranhas, o mundo que a gente vive é muito difícil.
                                                                                                     Edson (Negão)
Durante o depoimento observei que ele se sentiu importante, valorizado em poder contar parte de sua história.

Tanto os negros como os pomeranos viveram durante muito tempo excluído de direitos da igualdade de participação do desenvolvimento geral da sociedade. Ambos os grupos permanecem as cicatrizes do passado. Nos pomeranos permanecem os tempos de guerra que sofreram em sua terra natal e toda a dificuldade que passaram no início que fez com que o próprio grupo durante muito tempo buscou se isolar do resto da sociedade buscando essa proteção entre as montanhas capixabas. Os negros possuem suas cicatrizes enraizadas no período da escravidão, que gerou o preconceito racista na sociedade.
Fica subentendido em sua fala onde considera a importância do respeito entre as diferentes culturas para conquistar uma sociedade mais justa, onde a igualdade de direitos seja garantida apesar das diferenças, assim
o reconhecimento da diferença deve ser construído no sentido da ‘valorização’ e posterior ‘naturalização’ dessa diferença, para que a igualdade subjacente seja ressaltada. (VALENTE. 1995.p.44).
A utilização dessa metodologia promoverá um conhecimento de si e do outro em prol da reconstrução das relações raciais desgastadas pelas diferenças ou divergências étnicas.
A igualdade entre os povos é um passo fundamental para alcançar desenvolvimento econômico da população.
O preconceito racial se manifesta no momento em que as pessoas julgam com base nas características superficiais. Quando não conhecemos um indivíduo bem, começamos a caracterizá-lo, consciente ou inconscientemente, com base no que vemos. Isso ocorre devido à nossa ignorância,  normalmente as opiniões são formadas baseadas em generalizações: "todas as pessoas de tal ou tal raça são. . . consideram que alguns grupos são superiores que outros. Ideias existentes desde o início da formação da sociedade.



Referência:
Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça | GPP – GeR: módulo I / Orgs. Maria Luiza Heilborn, Leila Araújo, Andreia Barreto. – Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010.
VALENTE, Ana Lúcia E. F. Proposta metodológica de combate ao racismo nas escolas. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n.93, p.40-50, maio/95.


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