segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Trajetória política do movimento negro brasileiro desde o início do século XX
 Edir Marli Foeger
O surgimento das formas de organização e mobilização dos movimentos do século XX promoveu a atuação antirracistas, fazendo com que os negros enfrentassem publicamente o preconceito que os impediam viver seus direitos sociais e civis, principalmente contra o racismo existente das ideias do passado que se constituiu com o fim da escravidão, onde negros/as foram excluídos/as do mercado de trabalho e de outros espaços públicos. Este fato motivou os/as afro-brasileiros/as a construírem espaços próprios de sociabilidade, na qual pudessem frequentar sem que sofressem preconceito racial.
O Movimento Negro constitui-se pela luta dos afrodescendentes para resolver situações de preconceitos e discriminações raciais que os marginalizam no meio social, no mercado de trabalho, no sistema educacional e nos meios político e cultural.
Os jornais negros foram um estímulo nesse processo para os/as afro-brasileiros assumindo de forma crítica os preconceitos praticados na sociedade.
Em São Paulo o associativismo desencadeou a Frente Negra Brasileira (1931- 1937) contra a política antirracista, este se estendeu para outras regiões. Lideres e intelectuais desses movimentos eram chamados de elites negras. Essas organizações tinham como objetivo
garantir  a proteção  social  àqueles /as  que estavam visivelmente desamparados /as,  uma   vez  que  o Estado ainda não dispunha de  sistema amplo,  universal  e  capaz  de atender  a  todos /as   cidadãos/ãs (MOD. 03_UNID. 04, texto 01, p.175).
As mulheres negras nesse processo se destacavam pela sua formação educacional. O sociólogo Florestan Fernandes afirmou que “o movimento negro brasileiro modernizava os valores da sociedade, pois visava a transformações de caráter eminentemente democrático.” Vale lembrar que tais experiências políticas dos movimentos negros ocorreram em períodos democráticos. Pois o movimento acabou sendo desarticulada durante a vigência do Estado Novo, com regime político da Ditadura Militar.
Os regimes políticos significativos contra o racismo do período foram: a União dos Homens de Cor (UHC) e do Teatro Experimental do Negro (TEN). Ambas tinham o objetivo de dar visibilidade para a temática do preconceito racial, na valorização da identidade negra, no reconhecimento do ser negro/a brasileiro/a, visando sua inserção na comunidade política e econômica do país.
A nova mobilização antirracista veio a ter visibilidade pública com o novo contexto de democratização do país. Nas duas primeiras fases, a maior parte do movimento negro manteve-se afastado das formas tradicionais de organização das classes sociais.
Os/as intelectuais e ativistas dos movimentos negros/as inspiravam-se nas teorias marxista e dos movimentos negros norte-americanos e dos negros/as africanos/as, porém não se copiava as ações, adequava se a realidade do Brasil.
Na terceira fase, entretanto, boa parte do movimento negro se aproxima dos partidos e dos sindicatos, procurando estabelecer um liame nas ações de natureza classista e anti-racista.
O sociólogo Hasenbalg evidencia a existência de mecanismos discriminatórios, que prejudicam a mobilidade dos grupos de cor/raça do Brasil. O estudo trouxe a sustentação da luta antirracista no país, sendo que o movimento negro encontrava e encontra nelas bases argumentativas para seus discursos e ações, num contexto discriminatório entre indivíduos e grupos.
A atitude e a determinação das mulheres negras nos movimentos provocaram o rompimento da dominação masculina, pois até então havia a presença significativa das mulheres no movimento negro, mas muitas vezes limitava-se aos bastidores, “elas encontravam grandes empecilhos para ocupar as posições de dirigentes nas organizações políticas negras.”
As mulheres negras intelectuais se destacaram pelas reflexões das consequências do racismo sobre os negros dentre elas Beatriz Nascimento (1942-1995) e Lélia Gonzalez (1945-1994).
A historiadora Beatriz do Nascimento destaca o negro como participante da construção histórico-social e aponta os problemas gerados pela escravidão enfrentados pelo/a negro/a ao reconstituir sua identidade. Para ela as mulheres negras sofriam tanto pelo racismo devido pertencer a um grupo discriminado, como também pelo patriarcalismo, tais questões perpetuam sua subordinação na hierarquia social constituída ao longo do tempo.
Lélia Gonzalez buscava refletir e atuar em organizações coletivas com temáticas raciais.
Para Gonzalez tanto negros como brancos pobres sofrem pelo capitalismo.  Porém o negro sofre discriminações e preconceito racial gerando a hierarquização na estrutura social. Também destaca que é preciso mudar o pensamento social difundido em todas as classes, retirando os sujeitos femininos negros das posições inferiores. Constata-se que entre as classes sociais exista a exploração econômica, opressão política e dominação cultural que resulta na desigualdade econômica, no privilégio político e da discriminação cultural, respectivamente.
O primeiro movimento organizado de mulheres estava ligado ao movimento negro e feminista contra a ditadura. Com o objetivo de adquirir visibilidade, agenda própria e lutar contra a discriminação racista.
Um dos conflitos mais marcantes para a organização das mulheres negras como entidades autônomas ocorreu na ocasião da formação do Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo que, em 1984, se constituiu sem ter nenhuma mulher negra como integrante. Essa ausência de representação negra em espaços destinados à participação, fez com que se sentisse a necessidade de maior articulação política para sustentar as lutas das mulheres negras. 
Este processo proporcionou conquistas para as mulheres tanto no Conselho Estadual, quanto no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, criado anos mais tarde, em 1988.
As conquistas feministas beneficiavam as mulheres indiscriminadamente, por outro, o movimento de mulheres negras via a necessidade de manter seu questionamento sobre a pertinência de focalizar políticas para suas demandas específicas, a questão do racismo que se caracteriza em sua dominação e exploração potencializando os efeitos negativos para as mulheres negras.
O enfrentamento da militância negra junto ao Conselho da Condição Feminina foi fator decisivo para o fortalecimento e maior articulação das mulheres negras, surgindo outras redes de articulação de ativismo político, como o “I encontro Estadual de Mulheres Negras”, em São Paulo, no ano de 1984 e após quatro anos o “I Encontro Nacional de Mulheres Negras”, ampliando e fortalecendo a construção de coletivos em outras regiões do Brasil. Os debates referentes ao temas e demandas do movimento de mulheres negras foram ampliando-se à medida que o ativismo ganhava mais fôlego e experiência na ação coletiva.
A importância do movimento de mulheres negras trouxe impactos na sociedade suas experiências e ações habilitaram esse ativismo a desenvolver intervenções propositivas em diferentes instâncias.
Uma das principais reivindicações dos movimentos era o direito da cidadania. O movimento negro não reivindicava apenas a dimensão material e sim o patrimônio cultural. Busca-se o reconhecimento das diferenças a sua identidade social para que ela se sinta em condições de lutar pela sua dignidade na emancipação individual e coletiva.
O movimento negro contemporâneo cresceu, diversificou suas formas de ação transformando-se e obtendo várias conquistas. 
A constituição de 1988 foi o ponto crucial para o ativismo negro em suas ações de implementação de políticas públicas.
O I Encontro Nacional de Entidades Negras ocorreu na cidade de São Paulo, em 1991, devido à necessidade do fortalecimento negro, esse encontro trouxe a ascensão do movimento negro perante a sociedade e o estado.
Assim a busca do movimento negro é a universalização dos direitos, de acordo com os estudos do módulo 03 é a construção de uma imagem negra sem os estereótipos característicos do senso comum nacional, a valorização de práticas e saberes de comunidades negras tradicionais, o direito a terra aos descendentes de escravizados/as, além de educação diferenciada, voltada para o enfrentamento do racismo contra esses grupos.
Na década de 1990 fundou o órgão Fundação Palmares que tinha o objetivo atender demandas do movimento negro ligado a cultura. Em 1995, ocorreu a Marcha de 1995 que tinha como proposta ao Estado o enfrentamento das desigualdades raciais, para tanto deveria ter a destinação de verbas específicas para lidar com essa demanda. O resultado da Marcha foi o decreto presidencial que criava um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) com objetivo de promover políticas para “a valorização da população negra”. Em 1996, foi proposto Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH I), onde o governo assume o compromisso de realizar estratégias de combate às desigualdades raciais por meio de políticas direcionadas para a população negra.
Após a conferência de Durban e na gestão do Presidente Luís Inácio Lula da Silva destacadas duas ações importantes para todo o território nacional.
A primeira é a promulgação da Lei 10639/2003, que institui o Ensino de História e Cultura da África e dos/as Afro-brasileiros/as em todos os estabelecimentos de ensino do país.
A segunda ação foi a criação da Secretaria Especial Para Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), em 2003, com a proposta de envolver os ministérios e os demais órgãos do poder executivo para garantir a transversalidade das políticas de combate ao racismo.
Reconhece-se que a igualdade é importante para o desenvolvimento da sociedade. Nas últimas décadas várias mudanças significativas ocorreram na sociedade, negros adquiriram maiores níveis da educação e de participação no mercado de trabalho.
Constata-se que os movimentos surgiram em torno do racismo existente na sociedade, se constituindo de diferentes formas ao longo da história, dessa maneira tem contribuído de maneira visível para as conquistas dos direitos dos negros, porém faltam muitos esforços de diferentes setores da sociedade para a democracia de todos os espaços.


Referência:
Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça | GPP – GeR: módulo I / Orgs. Maria Luiza Heilborn, Leila Araújo, Andreia Barreto. – Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 20

Escola de Domingos Martins comemora o Dia da Consciência Negra

Matéria do site Montanhas Capixabas
publicada em 18/11/2011

                                           Foto: Roberly Pereira

Apresentações de sambas e pagodes por um grupo musical formado por estudantes, painéis fotográficos e cartazes com frases de efeito, oficina, danças, exposição artística e trabalhos ilustrativos diversos. Assim foi comemorado o “Dia Nacional da Consciência Negra” na sede de Domingos Martins.

O Dia da Consciência Negra é celebrado no dia 20 de novembro. Por ser domingo, a diretoria da Escola Teófilo Paulino adiantou a comemoração para esta sexta-feira (18). Todo o efetivo estudantil – 983 alunos matriculados nos três turnos – da instituição participou das ações sob clima fraterno.


De acordo com a diretora Delfina Schneider Stein, uma das principais ações do dia comemorado é o Desfile Beleza Negra, que teve a participação de 18 alunos e alunas do educandário. “Realizamos este projeto com muita humildade, mas com os conhecimentos dos nossos professores de história e geografia, baseados em pesquisas”, afirmou a diretora.


Segundo a coordenadora Fernanda Reinholtz, o trabalho foi preparado durante a semana com o apoio de pelo menos dez profissionais da instituição. Segundo Fernanda, um dos destaques do evento em homenagem à cultura africana é a Exposição Artística.

Fernanda ressaltou que com a realização deste projeto, a Escola Teófilo Paulino, de Domingos Martins, cumpre a Lei 10.639 de 2003, que institui estudos escolares da história afro-brasileira. “Além do prazer que um dia como este nos proporciona, estamos obedecendo à uma legislação”, disse.

Fonte: Disponível em <http://www.montanhascapixabas.com.br>. Acesso em 12/12/2011. Matéria de 18/11/2011.

domingo, 11 de dezembro de 2011

III Conferência Estadual de Políticas Públicas para as Mulheres: uma sociedade em movimento.

Ocorreu entre os dias 3 e 5 de Novembro a III Conferência estadual de Políticas Públicas para as mulheres, realizada no SESC de Aracuz, com o objetivo de discutir e elaborar políticas públicas voltadas para a construção da igualdade, tendo como perspectiva o fortalecimento da autonomia econômica social, cultural e política das mulheres, contribuindo para a erradicação da extrema pobreza e o exercício da cidadania da população feminina.



Diversas autoridades estiveram presentes, entre elas a Ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Iriny Lopes, a senadora Ana Rita Esgario e o secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos.
Aprovou-se a plataforma de políticas para as mulheres visando à construção do I Plano Estadual de Políticas para as mulheres. Essa plataforma tem como base os eixos e ações contidas no II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres que são eles: Autonomia das mulheres e redução da pobreza; enfretamento a todas as formas de violências contra as mulheres; saúde das mulheres, direitos sexuais e direitos reprodutivos; educação inclusiva, não sexista, não racista, não homofóbica, não lesbofóbica e enfrentamento do racismo, sexismo e da lesbofobia]
Além disso, a Conferência discutiu propostas e elegeu os delegados que representarão o estado na III Conferência Nacional que acontecerá entre os dias 12 e 15 de dezembro em Brasília. A solenidade será prestigiada pela Presidenta Dilma Roussef e também pela ex-presidenta do Chile, Michelle Bachelet, atual diretora da ONU Mulheres.













A III Conferencia Nacional de Políticas Públicas para Mulheres promete ser um espaço de grandes discussões a respeito da formulação de ações que garantam a igualdade de gênero no Brasil e também de pressão política para expansão dos recursos aplicados nessas áreas e para manutenção da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres com status de Ministério, condição que sofre ameaças segundo o noticiário político.
 Os primeiros imigrantes, discriminados e enganados por não falar português, preferiam se trancar em suas casas
Edir Marli Foeger
O preconceito racial afeta a todos. O racismo é a crença existente dentro do ser humano que se considera superior a outro grupo, fazendo com que haja a discriminação.
O racismo existente na sociedade é a persistência de ideias do passado que subdivide a raça humana em piores e melhores, essa concepção adquirida ao longo do tempo é ensinada através da relação de poder e de dominação que um grupo exerce sobre o outro. Tal ideia sobrevive na atualidade enquanto fruto da ignorância.
Orgulho pomerano. Várias tradições pomeranas têm sido mantidas ao longo do tempo. A principal forma de manter a cultura está sendo a língua que é passada de geração em geração, também é o caso da culinária de pratos típicos, como a sopa de pêssego, e o milhabraut (pão), os grupos de danças e bandas que fazem parte da Pommerfest, realizada na primeira semana de setembro em Melgaço Domingos Martins. "Essa valorização aconteceu da década de 80 para cá. Antes, nós não percebíamos a riqueza das nossas tradições", diz Hilda Braun, ex-professora.
O orgulho pomerano é bem recente. Vinte anos atrás, o termo "pomerano" era pejorativo, usado como sinônimo de gente tacanha, rude e grosseira. Isolados entre as montanhas os pomeranos se escondiam dentro de casa ao avistar gente estranha. Tinham medo porque não falavam o português e ainda hoje encontramos cidadãos pomeranos que não falam o português na comunidade. Outra razão de serem fechados ocorre devido a permanência das lembranças da expulsão de suas terras. Essa maneira de ser do pomerano levou-os a serem discriminados durante muito tempo. "Sofremos uma espécie de racismo de pele branca", define Ismael Tressmann. Hoje, toda forma de preconceito foi condenada pelo tempo: os pomerânios casam-se com pessoas de diferentes etnias, alemães, italianos e afrodescendentes, embora tenham suas preferências pelos próprios pomeranos. Percebe-se que existe um contato maior entre os pomeranos e outras etnias no trabalho e convívio social.
Manter a tradição não é a única dificuldade da cultura pomerana. Por terem uma pele branca e a grande maioria das famílias trabalharem em lavouras onde o sol os castiga sofrem com o câncer de pele. Cerca de 90 por centro dos examinados recentemente pela Universidade Federal do Espírito Santo e pela Associação Albergue Martim Lutero acusavam fotodermatoses, lesões que podem se transformar num câncer de pele se não for tratado.
A intoxicação por agrotóxicos que atacam o sistema nervoso central é outro grave problema que ainda os atinge, apesar da conscientização realizada pelas igrejas e escolas.
Aos poucos se percebe a inserção dos pomeranos na vida social, este fator está sendo adquirida graças ao acesso a educação, pois visualizamos mudanças nas comunidades pomeranas com a intervenção da igreja e eles próprios sentem a necessidades de buscar a escolarização para seus filhos, pelo fato de até pouco tempo atrás o camponês pomerano não considerar os estudos importantes para o seu dia a dia no campo.



Depoimento de um Negro que vive há 26 anos entre os pomeranos de Melgaço
                                                                             Edir Marli Föeger
Eu vim para cá através do meu irmão que trabalhava aqui, gostei muito do lugar, também gostava de jogar bola, logo fiz amizades.
Já ocorreram várias situações onde as pessoas me olhavam diferente, e faziam comentários, por estranhar a minha cor. Lembro da época quando cheguei aqui tinha um senhor que tinha terra perto onde eu tava ficando, ele dizia que não dava serviço para o preto, depois de um tempo, quando viu que eu trabalhava muito, ele me procurou pra trabalhar pra ele.
Outro coisa que lembro que aconteceu num dia que estava na casa de um amigo, aí chegou um senhor pra convidar ele para o casamento, quando saiu ele disse em pomerano “Kai schuat mit brinha” (não trazer preto junto) e eu entendi o que ele disse, eu já aprendi um pouco pela convivência, e eu respondi a ele “não se preocupe, gosto muito daqui, das festa, mas eu não vou desconvidado”.
Outra situação que aconteceu foi quando fui convidado pelo senhor XXXXX para o casamento de bodas de prata dele, eu fiquei feliz e fui no casamento, quando cheguei lá fui cumprimentar o casal, a esposa dele, que não me conhecia, chamou ele de lado e disse: “pra que você convidou esse homem preto pra vir aqui na nossa festa, ele vai arrumar confusão e problema pra gente”. Tempos depois comprei terra perto da casa deles e agora ela se arrepende do que ela disse no dia.
Isso foram coisas que aconteceram comigo. Pode até ser que isso seja preconceito, mas eu não levo isso como um preconceito que eles têm por mim, eu não tenho muito estudo, eu sei que os negros já sofreram muito, mas eu sempre me dei bem aqui. Já ouvi muitos negros falarem que não ficam aqui no meio dos pomeranos eles dizem que pomerano não gosta de preto, porém é o contrário, é só conquistar a confiança e ter respeito.
As vezes vou em algumas festas aqui dos pomeranos e só tem eu de negro, as pessoas olham muito pra mim, mas eu não ligo eu gosto dos pomeranos, não acho que sou discriminado, sempre tive respeito e todos me respeitam, consegui fazer uma grande amizade com esse povo.
A questão de ficar desconfiado acho que é normal, hoje todos nós devemos ficar desconfiado de pessoas estranhas, o mundo que a gente vive é muito difícil.
                                                                                                     Edson (Negão)
Durante o depoimento observei que ele se sentiu importante, valorizado em poder contar parte de sua história.

Tanto os negros como os pomeranos viveram durante muito tempo excluído de direitos da igualdade de participação do desenvolvimento geral da sociedade. Ambos os grupos permanecem as cicatrizes do passado. Nos pomeranos permanecem os tempos de guerra que sofreram em sua terra natal e toda a dificuldade que passaram no início que fez com que o próprio grupo durante muito tempo buscou se isolar do resto da sociedade buscando essa proteção entre as montanhas capixabas. Os negros possuem suas cicatrizes enraizadas no período da escravidão, que gerou o preconceito racista na sociedade.
Fica subentendido em sua fala onde considera a importância do respeito entre as diferentes culturas para conquistar uma sociedade mais justa, onde a igualdade de direitos seja garantida apesar das diferenças, assim
o reconhecimento da diferença deve ser construído no sentido da ‘valorização’ e posterior ‘naturalização’ dessa diferença, para que a igualdade subjacente seja ressaltada. (VALENTE. 1995.p.44).
A utilização dessa metodologia promoverá um conhecimento de si e do outro em prol da reconstrução das relações raciais desgastadas pelas diferenças ou divergências étnicas.
A igualdade entre os povos é um passo fundamental para alcançar desenvolvimento econômico da população.
O preconceito racial se manifesta no momento em que as pessoas julgam com base nas características superficiais. Quando não conhecemos um indivíduo bem, começamos a caracterizá-lo, consciente ou inconscientemente, com base no que vemos. Isso ocorre devido à nossa ignorância,  normalmente as opiniões são formadas baseadas em generalizações: "todas as pessoas de tal ou tal raça são. . . consideram que alguns grupos são superiores que outros. Ideias existentes desde o início da formação da sociedade.



Referência:
Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça | GPP – GeR: módulo I / Orgs. Maria Luiza Heilborn, Leila Araújo, Andreia Barreto. – Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010.
VALENTE, Ana Lúcia E. F. Proposta metodológica de combate ao racismo nas escolas. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n.93, p.40-50, maio/95.


Continuação das ações práticas
As reflexões realizadas na Especialização de Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça proporcionaram cada vez mais o sentimento de fazer algo em meu trabalho para transformar a concepção preconceituosa e racista que se formou na sociedade. Partindo do pressuposto de que a base para a diminuição da discriminação do preconceito racista e o desenvolvimento da sociedade é adquirida através da educação, venho realizando atividades em sala de aula que sensibilizam os alunos perante certas situações ocorridas na sociedade. Várias ações relevantes para a transformação da mentalidade racista são desenvolvidas, na EMEF Augusto Peter Berthold Pagung, como: leitura de textos que retratem o tema, reflexões e debates relacionando-os com a realidade, entre outras, uma das ações desenvolvidas foi o diário de bordo, onde os alunos se incorporam em um personagem no período da escravidão, e retrataram a luta e o sofrimento dos escravos. Segue abaixo um diário produzido pelos alunos.
Diário de bordo
Em meados do século XVIII, morávamos em Angola, onde tínhamos uma casa simples, mas aconchegante. Muitas vezes a vida era difícil, porém éramos felizes.
Certo dia saí para passear com meus 2 irmãos, num lugar pouco distante da vila, de repente, fomos surpreendidos pelo capitão do mato, que nos amarrou e nos levou ao porto de Luanda, onde estavam vários negros, nos puseram em fila com as mãos amarradas para dentro de um navio negreiro encaminhado-nos para o porão do navio. Foi um momento de aflição se ouvia choros, gritos desesperados por liberdade.
Saímos do porto e o silêncio tomou conta do navio, todos vencidos pelo cansaço e a dor do sofrimento, caíram no sono por algumas horas amontoados um sobre o outro.
No dia seguinte pensei em estar longe daquele sofrimento, porém percebia que tudo era real, o sofrimento aumentava, o espaço era pequeno para acomodar tanta gente, era o início de uma viagem sem volta, onde estávamos perdendo a nossa identidade, nosso lar, família e a nossa Pátria.
Os dias foram se passando e a situação era cada vez pior, o calor excessivo, a comida e a água escassa, a possibilidade de executar a higiene pessoal e coletiva era nula. Essa situação acabou por gerar diversos problemas entre aquela multidão no decorrer da viagem, tornando as pessoas cada vez mais debilitadas.
Numa certa manhã percebi que já havia crianças mortas, me assustei e constatei que haviam sido pisoteados pelos mais fortes. Os homens brancos desceram ao porão, recolheram os corpos e jogaram no mar. Essa foi uma a primeira cena horrível que presenciei. Assim os dias se passavam cenas tristes marcavam nossa memória, o feitor nos reprimia cada vez mais, quando ele chegava todos tremiam, pois algo ruim poderia acontecer.
Mais uma vez fomos surpreendidos por algo que amedrontou a todos nós, uma tempestade, o navio balançava muito, trovões clareavam o porão, pensei que ali fosse nosso fim. Tudo isso parecia uma eternidade. Ao amanhecer, notei um silêncio interrompido por gemidos e choros, observando as pessoas vi que havia mortos espalhados no chão, estes foram estrangulados uns pelos outros, acredito que não tenha sido um ato cruel, mas a tentativa de segurança em meio à tempestade.
A cada dia que passava a saudade aumentava da minha terra, pois a situação também era difícil, mas não se comparava com o sofrimento de agora.
Durante toda a viagem, fomos humilhados, tratados como selvagens e muitos mortos, as lembranças de nosso lar, de pessoas queridas não deixavam a nossa memória.
Dias depois, o feitor nos informou que nossa viagem estava a ter um fim, foi somente o que disse, aumentando ainda mais a nossa angústia e insegurança sem saber o que nos esperava em terra firme. Após alguns dias chegamos ao Rio de Janeiro, Brasil.
De lá partiram conosco para uma praça onde éramos agrupados em gaiolas com cinco pessoas, fomos comprados por um senhor que demonstrava ser rígido e autoritário.
O sofrimento continuava, eu e os outros escravos sofríamos castigos físicos no tronco, além das humilhações emocionais. Eu era uma moça bonita e o senhor da fazenda começou a me assediar. A esposa dele ficou sabendo, ela ficou furiosa mandou quebrar meus dentes, e cortar parte do meu nariz.
Várias noites acabei passando em claro com as lembranças de minha vida na África e desejando que tudo isso tivesse um fim.
 Essa é uma parte de um ciclo onde nós os negros fomos escravizados, tratados como instrumento para realizar o trabalho que movimentava a economia na época não tinha nenhum valor humano.
                                         Andressa, Letícia, Luanna e Lulaira
Neste trabalho houve grande sensibilização por parte dos alunos, pois ao se incorporarem no personagem do período da escravidão, o aluno se aproximou de todo o sofrimento no qual o negro passou, observei tanto nas falas como em algumas produções que este trabalho ajudou-os adquirir um pensamento mais crítico sobre o preconceito racista existente na sociedade. Outra questão observada como ponto positivo das ações desenvolvidas em sala foi no momento da avaliação escrita, onde obtivemos um bom resultado, pois ao estudar o tema não foram realizadas apenas as leituras de textos e exercícios de fixação, partimos para a reflexões de situações ocorridas na realidade.
Sabe-se que a escola tem uma função importante no sucesso das crianças, negras e brancas, para a formação do ser cidadãos(ãs). Assim entende-se que a escola precisa formar sujeitos com suporte para enfrentar a discriminação.
                                                            
                                                                                          Edir Marli Föeger